.../...

fico suspenso na expectativa

de um pensamento que rasgue o tempo

e me traduza o sonho das árvores



quarta-feira, 10 de agosto de 2011

TEMPESTADE NA SERRA


“.../... E quando a tempestade tiver passado, mal te lembrarás de ter conseguido atravessá-la, de ter conseguido sobreviver. Nem sequer terás a certeza de a tormenta ter realmente chegado ao fim. Mas uma coisa é certa. Quando saíres da tempestade já não serás a mesma pessoa. Só assim as tempestades fazem sentido.”
(Haruki Murakami, in 'Kafka à Beira-Mar')


Cai o crepúsculo tempestuoso
na alma da serra

Ramagens fustigadas pelo vento dobram-se
em reverência
perante o poder da tormenta,
vontade insana sem emoção ...

Nuvens informes
correm selvaticamente velozes, projectando
sombras indecisas nos caminhos de terra
que sulcam as veredas da floresta
encolhida

Relutante,
a tempestade afasta-se
deixando a natureza exaurida
no sortilégio da renovação transportada nas águas
que se abateram no solo

Um suave véu de neblina instala-se
na ausência do vento
mordiscando os sentidos que se rendem
ao entorpecimento
das árvores exaustas

O verde da floresta mescla-se no cinzento da bruma,
perde-se em sombras
deslizantes na percepção embotada

Locais familiares
dão lugar ao incógnito
numa transmutação ilusória
forrada pelo manto húmido de ar denso
criando novas paisagens
na imaginação

Apenas a luz conseguirá conquistar
as imagens familiares
que adornam a alma da serra
pacificada

A serra adormece
ansiando a chegada da manhã


JCE 08/2011

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